domingo, 13 de julho de 2008




E tudo num pequeno momento se transforma, são precisos anos e muitos acontecimentos para derrotar um homem, para o destronar, fazendo-o cair muitas vezes num charco de desordens, de aflições e até de maus presságios. São necessários anos e anos de luta para no fim, nada encontrar, nada alcançar. Os anos passam mas ele não gostava de regressar no tempo, a nostalgia fazia-o sempre querer voltar. O regresso ao passado era demasiado tumultuoso, demasiado penoso e custoso para o querer relembrar.
A carta recebida fazia algum sentido, a vida era a dele sem dúvida. Estava ansioso por devorar a segunda e a terceira carta.

Hoje acordei um pouco confusa, não sei o que faça, estou deveras indecisa, às vezes parece que temos que decidir qualquer coisa, nem que seja muito importante, ou haja grande necessidade. Mas a evolução normal da vida obriga-me a tomar decisões. Esperei demasiado tempo até te encontrar, não penses que nada fiz durante estes anos todos, também vivi uma vida com sensações, aliás, repleta de sensações, e aquela que mais perdurou foi a sensação de saber que te havia de encontrar um dia e poder abraçar-te, dizendo-te nos olhos o quanto esperei por este momento. Estou a enviar-te esta carta para que te certifiques da minha existência, com tudo, não quero agora, provocar-te mau estar.
Um beijo de saudades.
Juliana.

Juliana era a rapariga mais bonita de Ratury, era encantadora, e inteligente. As poucas coisas que soube sobre ela, depois que saiu da cidade, foi que esteve emigrada e nunca mais voltou até então.
A terceira e última carta era apenas uma morada, a morada de Juliana.

Prometo que não te volto a estorvar, se não o quiseres, deixa-me apenas deixar-te a minha morada. Se quiseres, aparece!
Juliana

A morada de Juliana estava ali. Pelo que parece não era muito longe da casa dele, e ir até lá era provavelmente muito boa ideia. Precisava de encontrar alguém com quem falar, alguém que o ouvisse e pudesse também partilhar algumas coisas com ele, mágoas, desencantos, momentos tristes e momentos felizes. Não importava o quê, apenas falar com alguém.
Mas reencontrar Juliana, poderia não ser agradável, muito menos depois do que havia acontecido, do que lhe havia feito. Provavelmente seria o momento certo para lhe pedir desculpa.
Nessa manhã saiu com uma expectativa completamente diferente sobre o mundo e a vida, o ar cheirava a terra molhada, e a relva molhada estava outra vez verde. A chuva era uma coisa fantástica. Regressou para trás para calçar umas botas e vestir uma gabardina, o fim do verão estava agora a ser anunciado, tal como o fim de um ciclo, que ele esperava estar a mudar para melhor.
A chuva tornou-se mais intensa, batia com energia no chão formando salpicos, rodopios. O caudal da água, um pouco mais abaixo, formava uma espécie de remoinho, enquanto se esgotava num escoadouro, mesmo em frente ao café onde iria entrar para tomar uma bebida quente.
As pessoas iam comentando que estava frio e que o verão havia acabado. Bebiam leite, café e chocolate quente, enquanto vislumbravam a fúria progressiva da chuva que estava a gritar vitória e anunciava a chegada do Outono. Deixou-se estar a ouvir umas quantas músicas naquele café, "My little town" fazia-o pensar em Ratury e inevitavelmente no Simon e no Garfunkel.

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